Sunday, July 31, 2016

Transmissão transgeracional de trauma (parte 2)

Introdução:
Conforme os estudos recentes da epigenética traumas de antepassados podem perturbar a vida do paciente. Jung já introduziu a ideia do inconsciente coletivo chamando atenção ao fato que o nosso bem estar emocional pode depender de um contexto maior do que das vivências individuais. Em março desse ano participei no Primeiro Congresso Internacional de Brainspotting em Búzios  (Rio de Janeiro). Trocando idéias com terapeutas do mundo inteiro, decidi integrar técnicas de brainspotting e uma visão de transmissão transgeracional de trauma (TTT) na minha abordagem terapêutica. Com os olhos abertos para a realidade da TTT o trabalho terapêutico de alguns pacientes chamou a minha atenção.

Apresentação da paciente:
A paciente se queixou de vários medos, especialmente o medo de perder o seu marido e familiares, acompanhados por pesadelos e angústia diária. Marcante era o seu medo de desgraças apesar de nunca ter sofrida com tragédias fortes na sua vida pessoal. Ela relatou que a sua mãe sofreu com uma desgraça familiar muito impactante perdendo o seu irmão por assassinato, esperando vários dias até que o corpo do irmão foi encontrado. Quando a paciente focou no sofrimento da mãe, ela sentiu uma tristeza e impotência enorme vindo da mãe.

Trauma transgeracional 

Transcrição da sessão:
A paciente visualiza a mãe muito nervosa e angustiada na casa dos avós. É a mesma angústia que a paciente sente. A mãe está tentando tomar conta da casa escondendo a sua angústia. A paciente sente a mãe muito amarrada. A mãe quis ir junto procurar o irmão. Ela sente dor de estômago e muita angústia. A mãe está interrogando o seu outro irmão para tentar entender o que aconteceu. As buscas não tiveram resultado. A paciente sente a mãe triste, cansada e perdida. Ela perdeu a esperança que iriam achar o irmão. A mãe olha para a cara sofrida do seu pai. É a mesma cara que os pais da paciente fazem nas despedidas. Assim como a mãe ficou impotente na época, a paciente ficou impotente na época que morava na casa da tia quando era criança. Ela visualiza o vô sentado e a mãe em volta dele. Ele ficou doente e a mãe se sentiu impotente, ficando por perto e fazendo o que podia. Ela sente insegurança e medo. A paciente chora lembrando do medo que a sua mãe sentia depois da morte do seu pai. A mãe temia que a sua mãe não iria suportar mais uma perda. A paciente vê a mãe confusa, triste e perdida e lembra dos seus pais com cara de dó nas despedidas. Por medo que a dor vai sobrecarregar a mãe, a mãe da paciente quer colocar a sua mãe numa redoma de vidro para que nada aconteça. A mãe se sente angustiada e tem muito medo de perder a sua mãe. A mãe olha para vó de cara triste e se sente impotente. A mãe queria tirar as dores da mãe, mas não pode. A mãe tem muito medo do dia de amanhã. Ela está insegura e perdida, com medo daquilo que vem. A paciente conhece bem esse sentimento e se sente em conflito. De repente tudo parece mais distante. Tempo passa. A vó foi morar em outra cidade e passa de vez enquanto um mês na casa da mãe. As despedidas são dolorosas, mas a mãe sabe que a vó precisa passar tempo na casa dos outros irmãos e tenta aceitar. A mãe sofre quieta em silêncio para não fazer a vó sofrer. A mãe se sente triste e angustiada depois da saída da vó. Ela sente dor de barriga. A mãe se sente triste e impotente, com medo do futuro. De repente encerra um ciclo. Ainda tem angústia, medo e tristeza. O olhar da mãe é triste. A vó era triste. A paciente se sente impotente, triste e amarrada, com medo do futuro. Angústia da espera. Olhando para mãe o estômago dói. Ainda tem tristeza e angústia. As sensações ficam cada vez mais leve e perdem o poder sobre a paciente. 

Conclusão:
A paciente conseguiu trabalhar a angústia da mãe que estava misturada com a sua angústia que ela sentia nas despedidas voltando para a casa da tia Acessando a dor da mãe, a dor é processada e perde o poder sobre a paciente.